Dor e sua relação com o medo
O termo “cinesiofobia” tem sido frequentemente usado quando se faz referência a pacientes com dor que resistem em aderir aos tratamentos que envolvem exercícios físicos.
Cinesio, segundo o dicionário Houaiss significa “ação de mover, mover-se, movimento” (pg.720), a palavra fobia (pg.1362) significa “medo exagerado, aversão; estado de angústia impossível de ser dominado, que se traduz por violenta reação de evitamento”. Assim, a cinesiofobia seria um medo exagerado, uma aversão ao movimento, à ação de mover-se.
Ainda visitando o dicionário, medo (pg. 1879) significa “um estado afetivo suscitado pela consciência do perigo; temor, receio, desejo de evitar.”
Medos, evitação, incertezas são situações frequentes na clínica do tratamento não farmacológico da dor.
Nas dores agudas, aquelas que costumam acontecer após um trauma, não mover a região da lesão é muitas vezes necessário para que a estrutura possa se regenerar adequadamente.
Em geral, existe um tempo de repouso recomendado para que o processo de cicatrização aconteça. Existe também, o tempo de voltar a usar gradativamente a estrutura, ajudando na remodelação dos tecidos e na retomada da função temporariamente interrompida.
Já nas dores persistentes e nas que se tornam crônicas, o contexto pode mudar. O paciente de dor crônica normalmente tem um longo histórico de busca por tratamentos. Ele passa por diversos profissionais de saúde e costuma ter uma vasta experiência de tentativas frustradas de solucionar seu problema. Essa experiência pode levá-lo a um certo grau de pessimismo em relação a sua condição e a possibilidade de mudá-la.
Se sempre dói, se tudo dói, como saber o que eu devo ou não fazer? Como eu sei se essa dor está ou não me machucando? Posso estar contribuindo de alguma maneira para piorar meu problema?, são dúvidas frequentes entre os pacientes.
Informações equivocadas, como por exemplo: “você não deve mais olhar pra cima”, “nunca mais suba escadas”, “de hoje em diante você está proibido de agachar”, são ainda hoje, passadas aos pacientes como se fossem verdades ou como se fosse possível viver sem executar gestos tão corriqueiros. Assim como as informações equivocadas, sem embasamento teórico sério sao passadas facilmente aos pacientes, a falta de informações corretas, como por exemplo: “nem tudo que aparece no seu exame de imagem é relevante ou tem correlação com a dor que você sente” ou “na grande maioria das vezes, palavras como “desgaste” ou “ degeneração” estão mais relacionadas ao processo natural de envelhecimento e não significam propriamente lesões”, sao muitas vezes, negligênciadas. Ou ainda, crenças distorcidas como: “imaginar que a coluna é extremamente frágil, como um cristal” ou “que é preciso manter determinados músculos contraídos o tempo todo para que eles sustentem o peso da cabeça”, são recorrentes. Todos esses fatores que podem levar ao medo de se mover e a consequente evitação do uso do corpo.
O desuso, a falta de mobilidade gera perda de função e de força. Ao tentar usar o corpo nessas condições, é provável que a dor apareça ou se intensifique, confirmando a crença de que o movimento pode ser prejudicial. Um círculo vicioso onde disfunção e dor se retroalimentam indefinidamente. Isso precisa parar.
O tratamento não farmacológico efetivo da dor envolve sempre algum grau de atividade física. Esse é nosso grande desafio: ajudar o paciente a aderir a essa ideia. Para tanto, é imprescindível que ele tenha toda informação possível sobre o que está acontecendo com ele, sobre quais são nossas propostas, no que elas estão embasadas, quais os objetivos que pretendemos e que podemos alcançar. Informação clara, com linguagem acessível, objetiva e correta, associada a dosagem adequada de cargas que vão gradualmente devolvendo mobilidade, funcionalidade e confiança, são a base do enfrentamento da dor e do medo que ela suscita.
Bibliografia:
Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, editora Objetiva, Rio de Janeiro 2004.
@tudosobredor – Leonardo Ávila PhD Neurociência
www.tratedor.com – Rogerio Liporaci PhD medicina e saúde